sábado, 6 de junho de 2009

Valsa


As mãos de Romeu estavam molhadas de suor e seu estômago revirou quando viu a figura de Julieta em sua frente. Ela estava tão ou mais nervosa. O sentimento de nostalgia tomou conta do casal, porém foi mais sereno do que esperavam. Ele levantou e a beijou na bochecha em cumprimento, convidando-a para sentar.
- O que gostaria de pedir? - Romeu perguntou.
-Café preto, sem açúcar. - Ela sorriu de volta.
Isso era tão Julieta, a única pessoa que tomava café puro. Eles riram disso, as lembranças retornando. Nem parecia que haviam passado dez anos desde a última vez que havia se visto. Até parecia um filme antigo, uma memória desgastada de um baile, de vestidos, de músicas e a valsa no salão.
-E então, como tem passado? O que tem feito da vida? Está trabalhando? - Ela perguntou.
-Você sempre faz muitas perguntas de vez?
-E você sempre me responde com outra pergunta.
Novamente riram. Era o salão novamente, a releitura de uma lembrança em que a valsa aproximaria dois corpos tímidos de duas crianças. E em plena juventude escondiam seus sentimentos que teimavam em transbordar no simples toque da dança, desenhando no cenário a inocência enquanto vislumbravam sobre o futuro. Apenas desejando que o momento durasse para sempre. Era uma promessa silenciosa e as testemunhas eram as luzes do salão.
-Você parece diferente. -falou Romeu.
-Mais feia ou bonita? - perguntou Julieta com graça. - Só cortei meu cabelo.
-Apenas diferente. - ele riu. - Talvez mais madura, Julieta.
Um choque percorreu a espinha dela e os pelos da nuca se arrepiaram. Aquela voz meio rouca chamando seu nome, um pouco mais firme agora. E ela observou, Romeu tinha uma aliança na mão direita. Era estranho pensar na dança que os havia colocado juntos. As palavras dele no meio daquele giro atordoante eram juras infantis, mas ao mesmo tempo intensas: "Espere Julieta, o dia em que eu irei dizer - pega sua mochila e vem comigo" e sairíam do salão sem rumo.
-E onde está o seu filhote? - Romeu perguntou.
-Foi comprar brinquedos com o pai. - ela falou com os olhos brilhantes. - Sinto saudades dele o tempo inteiro.
-Eu imagino.
O vento passou por eles e a tristeza de não precisar pensar em nada surgiu, a melancolia de saber que o tempo de ser irresponsável e agir impulsivamente havia passado. Assim, todas as promessas havia se desgastado. Não havia magoas, apenas saudade da valsa que inebriava os sentidos. Descobriram a dor de crescer e se perguntavam: O que era isso que não queriam perder?
A valsa havia parado, não havia mais música no salão.
Então as lágrimas viriam, porém perspicaz, Romeu agiu antes.
- Se eu pedisse para você fugir comigo agora, você fugiria?
Ela o olhou surpresa. O turbilhão de memórias não iria parar. Respirou fundo.
- Eu lhe pergunto a mesma coisa, Romeu. - Julieta sorriu. - Você fugiria comigo?
O sonho de todo adulto é voltar a sua infância, pois quanto mais longe as memórias ficam, mais preciosas elas se tornam. E por um único instante a música começou a tocar, as luzes do salão acenderam e eles deram as mãos. Talvez a valsa continuasse. Mas era apenas um talvez.



Mesmo que não possamos permanecer assim e sejamos levados pelo futuro, ela nunca irá mudar, nunca ficará manchada. (Honey & Clover)

2 comentários:

  1. Eu sou que nem a Julieta: não gosto de café-com-leite, e sempre fico querendo voltar no tempo...

    Espero que eles tenham um final menos cruel. (E consequentemente, menos interessante)

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