quinta-feira, 24 de junho de 2010

Desenredo

Escolheu beber café puro. Desejava que a vida parecesse menos amarga. Estava sentado entre duas poltronas vazias, parecia que haviam lhe pregado uma peça. Porém, não era homem de se incomodar com a solidão, já era afeiçoado a ela.
Bebericou um gole, um sorriso se espalhou por seu rosto com rugas. Parecia coisa da sua imaginação, mas esse café já tinha o gosto da França. Mesmo acima das nuvens já podia sentir a ansiedade de pisar no único lugar que poderia lhe trazer deleite.
Já escutava trechos de Pelléas Et Melisande ou melhor, o Bolero. Sempre preferirá Ravel em relação a Debussy, por sua arte ter sido recusada e ainda assim, ser uma das óperas mais conhecidas do mundo. Daquele jeito fúnebre com marcas de romance. Seus pés tamborilhavam ao ritmo.
E assim, no meio de tudo, ele se encontrava: velho, não tinha amante, muito menos filhos e com uma agenda de amigos que jamais ligaria para algum. E com um caminho em pleno céu. E talvez, ele pedia, algo novo acontecesse.
E aconteceu, inevitavelmente. Entretanto, este não era um homem de lamurias, com certeza, gostaria de sumir de vez. O café seria doce, pois não haveria nada. E melhor que isso, não precisaria ter a vergonha de um funeral sem ninguém.

Um comentário:

  1. [...]
    - Como você toma o seu café?
    - Negro como a noite, doce como o pecado.
    Fat Charlie colocou a caneca diante do homem e ofereceu-lhe o açucareiro.
    - Sirva-se à vontade.


    Trecho de um de meus livros preferidos, lembrei assim que li o post. Me identifiquei demais com o velho soltitário :D

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